REFLEXÃO - POR QUE ESTAMOS EM CRISE?

Estamos em crise porque tentamos construir pontes entre Deus e os homens. Estamos em crise porque fomos residir no edifício da modernidade e, na medida em que o teto desaba sobre nós, tememos por nós mesmos e por nossas vidas.
Estamos em crise porque confundimos o atemporal com o histórico, o supracultural com a cultura. Estamos em crise porque não aprendemos as lições da história e, depois de unirmos a Igreja com o Estado, decidimos unir o evangelho com a cultura.
E agora que o mundo está em crise, nós também estamos. Não porque não haja segurança nAquele que nos chamou, mas sim porque os nossos projetos seculares nada têm a ver com os propósitos eternos de Deus.
E agora, desesperados, pedimos a Ele que salve as nossas agendas, salve os nossos programas, salve os nossos empreendimentos lucrativos, que Ele salve nossas convicções seculares, que Ele salve nossas abordagens e este nosso "jeitão" de ser igreja. Quando Ele mesmo não possui compromisso com a areia do tempo, mas sim com a rocha dos séculos.
Estamos em crise porque confundimos o evangelho com a cultura, e agora que a cultura se esfacela, pensamos que o evangelho também tombará. Estamos em crise porque amamos mais os odres do que o vinho.
A pós-modernidade[1] não é o problema: a mudança de época não é o problema, mas sim a fusão da igreja com a cultura. Quando os pressupostos da modernidade são destruídos, isto nos atinge na medida em que estes também eram os nossos pressupostos, ou pior, a base das nossas convicções!
Assim, se nós só acreditamos na verdade através de trincheira acadêmica e não por causa de sua manifestação no tempo e no espaço, revelada em Cristo, o Verbo encarnado de Deus através do testemunho do Espírito, tenderemos a reduzir as nossas convicções de fé às novas e conflitantes perspectivas científicas.
O princípio da indeterminação de Heisenberg[2] só tira o sono de quem não crê que no princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. O declínio do Ocidente[3] só preocupa os ocidentais, e a Igreja, na medida em que ela se enxerga ocidental (miopia imperdoável). As duas grandes guerras do último século só abalaram as crenças pseudo-cristãs no progresso inabalável da sociedade.
A queda do Muro de Berlim só abalou um grupo de “cristãos marxistas” que apostaram no socialismo cristão e na teologia contextual. As crises político-institucionais da democracia liberal só preocupam os “cristãos democratas” que inventaram partidos com a assim chamada "posição cristã" no espectro político (o que geralmente significa uma social-democracia pálida), além do fato de que a gente sempre fica com a ideia de que Péricles era um grande doutrinador do cristianismo, seguido por Rousseau, Montesquieu e Keynes. A propósito, nós, cristãos, não somos adeptos de um Reino?
O fim da modernidade traz calafrios nos fundamentalistas, nos liberais, nos neo-ortodoxos, nos apologistas cristãos, nos evidencialistas, nos pressupocionalistas, nos líderes institucionais, nos defensores do movimento de crescimento de Igreja. Afinal, por que decorar tantos termos e nomes se as regras do jogo estão mudando?
Quem vai ler as evidências que exigem um veredito?[4] Se a apologética clássica é fruto de uma modernidade que buscava evidências para acreditar naquilo que é objeto de fé? (Não foi o Senhor quem disse: "Bem-aventurados os que não viram e creram"?) Esta é a nossa atual crise, mas, graças a Deus, ela não tem nada a ver com a verdadeira igreja de nosso Senhor Jesus Cristo!
Notas de rodapé:
- [1] Pós-modernidade: Termo que designa a transição cultural, social e intelectual posterior à modernidade, caracterizada pela fragmentação, pela rejeição de metanarrativas e pelo relativismo.
- [2] Princípio da indeterminação de Heisenberg: Postulado pelo físico Werner Heisenberg, esse princípio da mecânica quântica afirma que não é possível determinar simultaneamente e com precisão absoluta a posição e o momento de uma partícula.
- [3] Declínio do Ocidente: Referência à obra O Declínio do Ocidente (Der Untergang des Abendlandes) de Oswald Spengler, que analisa a decadência cultural e política das civilizações ocidentais.
- [4] Evidências que exigem um veredito: Alusão ao livro Evidence That Demands a Verdict, de Josh McDowell, obra apologética que defende a fé cristã com base em argumentos históricos e evidências documentais.
Manoel Gonçalves Delgado Júnior.
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