ARTIGO - EXISTE UMA REVELAÇÃO GERAL?
EXISTE UMA REVELAÇÃO GERAL?
Por
Manoel Gonçalves Delgado Júnior.
“[...]contudo,
não se deixou ficar sem testemunho de si mesmo, fazendo o bem,
dando-vos do céu chuvas e estações frutíferas, enchendo o vosso
coração de fartura e de alegria.”
Atos
14:17
Introdução.
No século XX este foi o tema de um vigoroso debate dentro da
corrente teológica denominada Neortodoxia. Para Emil Bruner
existiriam pontos de contato entre os cristãos e os não
cristãos a partir de uma revelação comum a todos os homens, já
para Karl Barth não[1], pois somente o conhecimento de Deus,
em Cristo, seria um conhecimento verdadeiro. Além do que, para
Barth, era imperativo contrapor-se a teologia liberal dos seus dias,
que na Alemanha estava totalmente comprometida em fortalecer a figura
do Füher compreendendo o desenvolvimento histórico do Estado Alemão
Nazista como a pretensa evolução e progresso do espírito humano.
Também
do continente europeu, o teólogo protestante Francis Schaeffer
escreveu contundentes críticas a teologia natural
desenvolvida por Tomás de Aquino, que em sua análise, seria o
grande responsável pela ruptura entre verdade e fé, ocasionando a
morte da razão e o advento da teologia liberal e o processo de
secularização no ocidente. Porém no campo da missiologia,
poderíamos mencionar a obra de Don Richardson, o aclamado autor de O
Fator Melquisedec que se fundamenta na premissa de que Deus teria
deixado pontos de contato, nas diferentes culturas do mundo para que
o evangelho pudesse ser pregado entre os povos.
Diante
de opiniões tão diversas, surgem algumas questões: Existe de fato
uma revelação geral? Qual seria o propósito desta revelação?
Qual seria a sua extensão depois da queda? Seria possível a
constituição de uma teologia natural?
Poderíamos
definir a Revelação Geral como a revelação que Deus deu a todos
os seres humanos desde a criação do mundo, para que os mesmos
viessem a contemplá-lo, conhecê-lo (como santo, justo e bom), e
para que a partir daí os mesmos pudessem expressar o seu amor e a
sua obediência. Ver Gênesis 1:26-31
Por
esta definição, estamos querendo dizer que a revelação geral
existiu como o conhecimento de Deus que foi dado a todos os homens,
conhecimento este, que é anterior a queda. O seu propósito básico
era o de revelar o Criador levando os homens a se relacionarem com
Ele.
Com
a queda este conhecimento foi drasticamente reduzido, não devido à
extinção desta revelação, mas sim por consequência da perda da
comunhão com o Criador decorrente da entrada do pecado no mundo, bem
como pelos efeitos noéticos [1] do pecado que afetaram seriamente a
capacidade de compreensão dos homens, e também pela obstinação e
resistência que os seres humanos passaram a ter contra Deus e a sua
revelação.
De
acordo com Sproul[2], a revelação geral pode ser subdividida em
imediata e mediada.
Revelação
geral mediada. Salmo19:1-5//
Jó 38:41 - É a revelação de Deus por meio das obras da criação.
Quando
olhamos um céu estrelado, o nascer do sol, quando contemplamos a
beleza natural de nossa terra, ou quando pensamos na complexidade de
um corpo humano deveríamos ser impelidos por um desejo incontido de
adorar a Deus, o nosso criador. Qualquer desejo em outra direção é
apresentado nas escrituras como um ato de idolatria.
Aristóteles
em sua obra "Metafísica" sumariou os principais argumentos
racionais ou "provas" para a existência de Deus.
Posteriormente Tomás de Aquino, no período medieval retomando e
atualizando a reflexão aristotélica, apresentou o que ele denominou
de "vias racionais" para a existência de Deus. Em períodos
mais recentes apologistas como Willian Lane Graig, Norman Geisler, R.
C. Sproul tem atualizado esta abordagem evidencialista. Também
deve-se mencionar filósofos, teólogos e cientistas contemporâneos
que tem defendido o conceito de Design Inteligente. Philipp Jhonson,
Michael Behee, e Jhon Lennox em contexto Internacional e Marcos
Eberlin e Adalto Lourenço são expoentes desta perspectiva no
Brasil.
Revelação
geral imediata. (1)Romanos 1:21//
(2)Atos 17:28// (3)Romanos 2:14-15. É a norma da lei, que Deus
gravou no coração dos homens e a revelação direta que Ele dá de
si mesmo.
A
revelação geral imediata pode ser demonstrada através dos
conceitos de:
(1)
Senso divino[3]
– O conhecimento de Deus é um conhecimento necessário e
inato,
sendo reafirmado em diversos povos na figura de um Ser Supremo.
A
noção de Deus, como um ser único e supremo não é exclusividade
da tradição judaico-cristã. Na antiguidade, Platão
e
Aristóteles (gregos), Cícero (romano), Akhenaton (egípcio) já
concebiam
um Deus único como fonte e origem de todas as coisas.
Ainda
no período escolástico Anselmo de Canterbury, desenvolveu o
argumento ontológico que afirma que Deus é "o
ser acerca do qual nada de maior pode ser concebido."
Sendo a sua existência ontologicamente necessária. Esta ideia
depois foi reformulada e reapresentada por Karl Barth, e Alvin
Platinga.
Devemos
o conceito teológico de senso divino, ou "sensus divinitatis",
ao reformador João Calvino. Para Calvino, o homem natural foi criado
com um conhecimento de Deus gravado
em sua
consciência. Nem mesmo os efeitos do pecado na
mente humana em decorrência
da queda e depravação total do
ser humano
poderiam
apagar esta noção,
acerca da divindade.
No
século XIX, Andrew Lang formulou o conceito de “Ser Supremo” por
perceber que a grande maioria dos povos tradicionais possui na sua
cosmologia a figura de um criador do universo, estabelecedor dos
destinos, detentor de grande poder e geralmente considerado bom.[4] A
partir dos estudos mais recentes da fenomenologia da religião, no
âmbito da missiologia[5] têm-se demonstrado que o conceito de “Ser
Supremo” é bastante difundido entre os povos do mundo,
contudo, estes mesmos autores, consideram que seria uma ingenuidade
teológica crer que todas as formulações culturais deste Ser
Supremo, correspondam ao Deus da revelação geral. Contudo deve-se
afirmar que não existe povo, nação ou cultura sem a noção
arquetípica do sagrado e do divino. A revelação de Deus é
universal.
(2)
Senso moral
– é a
norma
da lei gravada nos corações dos homens, para o estabelecimento da
vida e para constituição de uma ética comum para o convívio
humano. Esta é a base, e a gênese da discussão moderna acerca dos
direitos humanos.
De
acordo com o Jusnaturalismo[6] existem valores de caráter universal,
que estão associados à identidade humana. Atualmente alguns autores
tem falado acerca de “valores autônomos[7]” que seriam valores
que não estão confinados a épocas ou lugares; que se revelam
concretamente nas tradições humanas, mas as transcendem refletindo
a estrutura antropológica humana. São valores tais como a verdade,
a beleza, o amor, a esperança, a convivência, a solidariedade entre
outros. Estes valores são imprescindíveis para a existência
pessoal e comunitária do gênero humano e sua relação com as
demais espécies da criação.
(3)
Religiosidade Comum –
Outro ponto apresentado como uma evidencia desta revelação geral,
seria justamente a constatação da universalidade do fenômeno
religioso.
Esta
religião parte da percepção do homem de que ele encontra-se
divorciado do sentido último de sua existência (Deus) e está em
constante busca de reparação deste mal estar. A religião seria em
seu sentido etimológico mais evidente a tentativa humana de
religar-se com Deus.
Conclusão:
Estes são em linhas gerais os argumentos principais e noções que
definem a doutrina da revelação geral. Contudo, é importante
mencionar que embora esta revelação de fato testemunhe a existência
de um Criador, e possa ser uma base para instituições humanas e
formulação de uma ética comum. Ela é insuficiente, e inadequada
quando o assunto é a redenção. É na revelação especial, cujo o
conteúdo é o evangelho de Cristo, que o conhecimento suficiente e
necessário para a redenção do homem é comunicado.
[7]
LIBANIO, João Batista, As
lógicas da cidade: o impacto sobre a fé e sob a fé,
2Edição , São Paulo, Ed. Loyola
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